quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Piadinha nuclear, mas é pra refletir!

Um estranho estava sentado ao lado da Mariazinha em um avião quando vira-se para ela e diz: "Vamos conversar. Ouvi dizer que os vôos passam mais rápido quando você conversa com a pessoa ao lado".

A menina, que tinha acabado de abrir seu livro, fechou-o lentamente e disse ao estranho: "Sobre o que você gostaria de falar?"

"Oh, eu não sei", disse ele. "Que tal sobre a energia nuclear?"

"OK", ela respondeu. "Isso pode ser um tópico interessante. Mas, deixe-me fazer uma pergunta primeiro: um cavalo, uma vaca e um cabrito, todos comem a mesma coisa: grama. Mas, o cabrito libera umas poucas bolinhas, enquanto a vaca gera um bolo pastoso e o cavalo produz rolhas de capim seco. Por que você acha que é assim?"

O estranho pensa sobre isso e diz: "Hmmm, não tenho idéia."

A menina então responde: "Você realmente se sente qualificado para discutir energia nuclear se você não sabe MERDA NENHUMA?"


Fonte: Daily Joke... Qualified to Discuss Nuclear Power?


É isso aí, pessoal. Todos conhecemos pessoas que se propõem a discutir algo sem saber nada, além do velho senso comum, sobre o assunto. E quando o papo é energia nuclear, então? Dá até medo de tanta baboseira e desinformação! Por isso, caro leitor, informe-se! Procure diversas fontes! Ah, leia também meus posts mais antigos e, se você gostar do blog, ajude-me a divulgá-lo! (ok... ok, já acabou o momento "marketeiro"!).

E tem novidade no blog! No canto superior direito, abaixo da caixa de busca, adicionei uma enquete. Participem, é só um clique!

sábado, 24 de setembro de 2011

O Projeto Manhattan em filmes

J. R. Oppenheimer e Leslie R. Groves. 




Projeto Manhattan é o codinome do plano secreto dos Estados Unidos para desenvolver as primeiras bombas atômicas e representa a designação mais ampla para as pessoas, locais e recursos envolvidos na pesquisa atômica durante a Segunda Guerra Mundial.

O General Leslie R. Groves assumiu a gerência do projeto em 1942 e escolheu o físico J. Robert Oppenheimer, professor de Física teórica em Berkeley, como chefe das pesquisas. Em três anos, centenas de milhares de pessoas estiveram envolvidas com o projeto, que teve um orçamento de 22 bilhões de dólares atuais (ou 2 bilhões na época).

Embora o Projeto Manhattan tenha envolvido pesquisa e produção em diversos locais dos Estados Unidos (veja o mapa abaixo), e também do Canadá, cinco cidades merecem destaque:

1. Chicago, onde o físico italiano Enrico Fermi iniciou a primeira reação de fissão nuclear em cadeia auto-sustentada;
2. Oak Ridge, onde foi obtido o Urânio-235 para a bomba "Garotinho" ("Little Boy");
3. Hanford, onde foi obtido o Plutônio-239 para a bomba "Gordo" ("Fat Man");
4. Los Alamos, no Novo México, onde as bombas foram de fato projetadas e construídas e
5. Alamogordo, codinome "Trinity", local do teste da primeira bomba de plutônio.

Rede de Instalações e laboratórios de pesquisa do Projeto Manhattan. Fonte: Wikipedia.

Para descobrir os detalhes do Projeto Manhattan através de filmes, selecionei para vocês três documentários e um drama que retratam o assunto.

1. PROJETO MANHATTAN - MARAVILHAS MODERNAS

Sinopse: Este documentário revela passo a passo o projeto que mudou o mundo. Fornece uma visão geral do tema, desde os primeiros experimentos de fissão nuclear até o lançamento das bombas em terras japonesas.

Tempo de Duração: 45 min. (o aúdio não está muito bom, mas não encontrei nenhuma versão melhor)












2. AS CIDADES SECRETAS DA BOMBA ATÔMICA - MUNDOS PERDIDOS

Sinopse:  Através dos prédios e ruínas em Oak Ridge, o documentário reconstrói detalhes da participação crucial dessa cidade no Projeto Manhattan em sua busca pelo Urânio-235. As ruínas de Los Alamos também são investigadas.

Tempo de Duração: 45 min








3. AS FÁBRICAS SECRETAS DA BOMBA ATÔMICA - MUNDOS PERDIDOS

Sinopse: A participação de Hanford na obtenção do Plutônio para a bomba "Gordo" é investigada nesse documentário que aborda, além do Projeto Manhattan, a construção de bombas durante a Guerra Fria. Os locais de testes das bombas em Nevada e um silo, em Tucson, que guardava o míssil Titan 2, são visitados.

Tempo de duração: 45 min.








4. O ÍNICIO DO FIM (FAT BOY AND LITTLE MAN)

Sinopse: Durante a Segunda Guerra Mundial, no remoto deserto do Novo México, o "projeto Manhattan" está se materializando: a bomba atômica está sendo construída. Paul Newman vive o General Leslie Groves, o militar que comanda o poderoso projeto que vai produzir duas armas: "Gordo" e "Garoto". Dwight Schultz é J. Robert Oppenheimer, o brilhante cientista tentando tornar a impressionante missão uma realidade. Bonnie Bedelia, John Cusack, Laura Dern e Natasha Richardson co-estrelam este filme, que recria um dos capítulos mais marcantes da história (trailer em inglês abaixo).

Tempo de duração: 126 min.

Ano de Lançamento: 1989.




Para Saber Mais

Datas importantes do Projeto Manhattan (em inglês)

Os custos do Projeto Manhattan
(em inglês)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Teste seus conhecimentos de Geopolítica Nuclear

Irã, Estados Unidos, Coréia do Norte, bomba atômica, Tratado de Não-Proliferação... Você está atualizado sobre o que rola na geopolítica nuclear?

O Guia do Estudante preparou um teste com 10 questões sobre o assunto. Confira aqui!


Ameaça nuclear iraniana  –   Charge: Alpino

sábado, 17 de setembro de 2011

Queimar carvão para enriquecer e reprocessar Urânio: que papo é esse?

No dia 01 de Setembro, publiquei um post sobre o texto do Dr. Alfredo Bosi na Folha de São Paulo. Hoje, irei falar um pouco sobre um ponto desse texto que não foi explorado no primeiro post:

"O enriquecimento do urânio depende de eletricidade gerada por combustí­veis fósseis, como o carvão. Duas das minas de carvão mais poluentes dos Estados Unidos, em Ohio e em Indiana, produzem eletricidade para enriquecer urânio". Dr. Alfredo Bosi em Tendências e Debates, Folha de São Paulo, 21 de Agosto de 2011.

O texto do qual o Dr. Alfredo Bosi obteve essas informações foi publicado na seção "Think again" da revista norte-americana "Foreign Policy", em 31 de Outubro de 2005 (acesso ao texto completo aqui, mas é necessário se cadastrar). O trecho original do ambientalista Benjamin Sovacool é o seguinte:

Nuclear Power Is a Clean Form of Energy

Unfortunately, no. When President George W. Bush signed the energy bill in August, he remarked, only nuclear power plants can generate massive amounts of electricity without emitting an ounce of air pollution or greenhouse gases. This claim is flat-out wrong. The reprocessing and enrichment of uranium often relies on fossil fuel-generated electricity. Data from the Institute for Energy and Environmental Research and USEC, a uranium enrichment company, indicate that enriching the amount of uranium needed to fuel 1,000-megawatt reactor for a year using the most efficient method can require 5,500 megawatt hours of gas- and coal-fired electricity (a 10-megawatt power plant running for 550 hours). Two of Americas most polluting coal plants in Ohio and Indiana produce electricity primarily for uranium enrichment. In this way, many nuclear power plants contribute indirectly but substantially to global warming, and fail to reduce U.S. dependence on petroleum and coal.

Traduzindo:

Energia nuclear é uma forma limpa de energia

Infelizmente, não. Quando o presidente George W. Bush assinou a conta de energia em Agosto, ele observou que somente as usinas nucleares podem gerar grandes quantidades de eletricidade sem emitir uma onça (ou cerca de 29 gramas) de poluição do ar ou gases do efeito estufa. Esta afirmação á totalmente errada. O reprocessamento e enriquecimento de urânio muitas vezes depende de eletricidade gerada por combustí­veis fósseis. Dados do Instituto de Energia e Pesquisa Ambiental e da USEC, uma empresa de enriquecimento de urânio, indicam que a quantidade de urânio enriquecido necessário para abastecer um reator de 1.000 megawatts por um ano, usando o método mais eficiente de enriquecimento, pode exigir 5.500 megawatt-horas de eletricidade gerada por gás e carvão (uma usina de 10 megawatts em execução por 550 horas). Duas das mais poluentes usinas à carvão em Ohio e Indiana produzem eletricidade principalmente para o enriquecimento de urânio. Desta forma, muitas usinas nucleares contribuem indiretamente, mas substancialmente, para o aquecimento global, e não para reduzir a dependência dos EUA do petróleo e carvão.


Bem, após pesquisar o assunto, conclui que é QUASE tudo verdade! O problema está na conclusão do ambientalista Benjamin Sovacool.

De fato, dizer que a geração de eletricidade a partir da energia nuclear não emite nem uma titica de gases que contribuem para o aumento do efeito estufa é mentira. Isso porque, embora durante a operação da usina não haja emissões significativas, devemos considerar toda a cadeia de produção, desde a construção da usina até o seu desaparelhamento ("decommissioning"), passando, inclusive, pelo processo de produção do combustível. É por isso que nos gráficos que comparam as diferentes fontes de energia (como o da figura abaixo) a emissão de gases do efeito estufa associada à energia nuclear não é zero.

Comparação da emissão de CO2 no ciclo de produção de eletricidade para diferentes fontes de energia. Compilação de 20 estudos sobre o assunto feitos por diversos países e órgãos (universidades, governos e indústrias). FONTE: World Nuclear Association.

A Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA) estima que as etapas da produção que mais contribuem para a emissão desses gases nos reatores do tipo PWR (como os de Angra dos Reis) são a extração do minério de urânio, a conversão (do yellowcake em hexafluoreto de urânio), o enriquecimento, o reprocessamento do combustível usado e a construção/desaparelhamento da usina. O reprocessamento, ainda segundo a Agência, pode ser responsável por até 15% da emissão total desses gases na geração nucleo-elétrica.

Assim, dizer que usinas nucleares contribuem INDIRETAMENTE para o aquecimento global é verdade. Mas, dizer que elas contribuem SUBSTANCIALMENTE para isso é forçar a barra.

O fato é que é necessário energia elétrica para realizar o enriquecimento e o reprocessamento do combustível nuclear. Entretanto, a emissão de gases que contribuem para o aumento do efeito estufa associada a essas etapas de produção depende da forma como é gerada essa eletricidade. No caso dos Estados Unidos, a energia elétrica vem majoritariamente da queima do carvão (veja figuras abaixo). Para os Estados citados no texto por exemplo, 87% da energia elétrica de Ohio é gerada a partir do carvão, enquanto que no Estado de Indiana esse número sobe para 94%.

Contribuição de diferentes fontes de energia para a produção de eletricidade nos Estados Unidos. FONTE: Adapatada da U.S. Energy Information Administration.

Produção de eletricidade a partir da queima do carvão por estado norte-americano. Em destaque, os estados  de Ohio e Indiana. FONTE: Infográfico interativo no site da NPR.

No caso do Brasil, por outro lado, nossa energia elétrica vem principalmente das hidrelétricas (veja tabela abaixo). Logo, uma central de enriquecimento aqui produziria, indiretamente, menos gases do efeito estufa do que essa mesma central nos Estados Unidos. E quanto menor a participação do carvão, do petróleo e do gás natural na produção de energia elétrica, menor a emissão de gases do efeito estufa associada ao enriquecimento e reprocessamento do combustível nuclear.

Fonte de eletricidade no Sistema Interligado Nacional. FONTE:Plano Decenal de Expansão de Energia - Empresa de Pesquisa Energética.

Para ter uma idéia melhor do que os números citados no texto significam em termos de energia, que tal fazermos uma continha? Para isso, precisamos responder duas perguntas: quanta energia é gasta para enriquecer o urânio e quanto energia é produzida depois por esse urânio que foi enriquecido?

Quanto à primeira pergunta, conforme o texto mesmo exemplifica, são necessários 5.500 MWh de energia para enriquecer a quantidade de urânio que abastecerá um reator de 1.000 MWe de potência por um ano.

Quanto à segunda pergunta, lembrando que ENERGIA corresponde à multiplicação da POTÊNCIA pelo TEMPO de operação e supondo que a usina nuclear funcione com 85% de sua capacidade operacional (hipótese razoável para a usina Angra 2), em um ano um reator de 1.000 MWe de potência irá gerar (1.000 MW)x(365 dias)x(24 horas/dia)x(fator de capacidade de 0,85) = 7.446.000 MWh de energia.

Note que a energia gasta no enriquecimento (5.500 MWh) dividida pela energia gerada com o combustível enriquecido (7.446.000 MWh) é menor que 0,08%. Logo, gastou-se pouquíssima energia no processo de enriquecimento comparado à enorme quantidade de energia produzida pelo reator que, especificamente no caso norte-americano, evitou que mais combustíveis fósseis fossem queimados!


Para saber mais

IAEA - Greenhouse gas emissions of eletricity generation chains: Assessing the Difference

U.S. Energy Information Administration - Annual Energy Review

Infográfico - Visualizing The U.S. Electric Grid

World Nuclear Association - Comparison of lifecycle greenhouse emissions report

Empresa de Pesquisa Energética  - Plano Decenal de Expansão de Energia

Comparação da emissão de gases de efeito estufa (GEE) na geração nuclear de eletricidade no Brasil com as de outras fontes



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quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A opinião pública da tecnologia nuclear em meio século de História

Nada mais controverso que a energia nuclear. As “boas” e “más” aplicações da energia dos núcleos atômicos dividem a opinião pública em um cabo de guerra que já dura mais de meio século. A tecnologia que nos anos 50 era sinônimo de progresso para uma vida melhor, nos anos 80 transformou-se em um “demônio” abominado pela maioria da população. O debate sobre energia nuclear tornou-se quase uma guerra religiosa e a discussão, filosófica, girava em torno da natureza intrinsecamente boa ou má dessa tecnologia.

Na última década, no entanto, com os benefícios da Medicina Nuclear e a ausência de acidentes de grande magnitude nas usinas nucleares, esse cabo de guerra ficou mais balanceado. As pesquisas periódicas realizadas pelo o Instituto de Energia Nuclear (NEI, em inglês) revelam um aumento expressivo da opinião norte-americana a favor da geração de eletricidade a partir da energia nuclear: de 43%, em 1983, para 74%, em 2010.

No momento em que a indústria nuclear ensaiava a sua re-estréia, o desastre natural no Japão abalou sua popularidade. O acidente nuclear ocasionado pelo tsunami foi acompanhado em tempo real pelas redes e mídias sociais, mantendo o acidente na pauta da televisão, mesmo em sua fase de gestão de danos. Segundo a pesquisa realizada com 47 países em Abril (logo após o acidente) pelo Gallup-Global WIN, a reação negativa ao uso da energia nuclear subiu 11 pontos percentuais na média global, de 32% para 43%, na comparação das pesquisas antes e depois do acidente de Fukushima. No Brasil, em especial, a reação negativa subiu cinco pontos, de 49% para 54%.

Os defensores mais dedicados acreditam que a energia nuclear é segura, necessária e capaz de alcançar o sucesso, bastando somente a redução da oposição para isso. A grande maioria de físicos e engenheiros pertence a essa categoria, defendendo soluções técnicas para grande parte dos problemas da humanidade. Desse mesmo lado, estão aqueles com certo conhecimento técnico, mas que se preocupam com a habilidade dos homens em evitar acidentes ou garantir a segurança das instalações nucleares.

Por outro lado, há os cidadãos que desconfiam dos Governos e alertam a todos dos perigos dos acidentes envolvendo a tecnologia nuclear, como o acidente radiológico de Goiânia, o de Chernobil e, mais recentemente, o de Fukushima. Tais cidadãos costumam ser fortemente influenciados por discursos antinucleares e tendem a se opor ao desenvolvimento dessa tecnologia, embora reconheçam a necessidade de geração de energia e do avanço da medicina nuclear. Por fim, há os oponentes árduos da tecnologia nuclear, como alguns membros do Greenpeace, que discursam ativamente, geram polêmicas e participam de manifestações contrárias ao uso e desenvolvimento dessa tecnologia.

O fato é que a opinião pública sobre a tecnologia nuclear já mudou muito desde os experimentos de Rutherford que revelaram o núcleo dos átomos no início do século XX. Como na Democracia a voz do povo é um dos fatores que ponderam as decisões governamentais, o futuro da tecnologia nuclear depende, pelo menos em parte, da opinião pública. E, como diz o psicólogo James Flynn, pesquisador da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, compreender como o estigma nuclear foi criado é fundamental para entender como lidar com ele.


Do paraíso ao inferno

Nos anos 50, a energia nuclear era anunciada pela Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos, e também pela imprensa, como barata, inesgotável e segura. O congresso norte-americano apoiava o desenvolvimento de reatores nucleares e o público em geral parecia sentir que um grande progresso estava sendo feito. Surgiram nessa época os primeiros submarinos nucleares. A Ford chegou até a criar um carro conceito em 1958, o Ford Nucleon, movido pela fissão do Urânio em um pequeno reator nuclear (veja esse post).

Na década de 1960, no entanto, diversos fatores levantaram preocupações no público, iniciando o processo de reversão desse parecer favorável. Primeiro foi o movimento da juventude contra as regras e as autoridades. Na busca daquela geração por um estilo de vida mais simples e mais "natural", preferiu-se o uso da madeira e da energia solar ao de energia baseada na alta tecnologia. Outro alvo da oposição foi o complexo militar-industrial responsabilizado pela impopular Guerra do Vietnã. A versão 1980 dessa filosofia defendeu a descentralização do governo e da indústria, favorecendo pequenas unidades de energia controladas localmente, com base em recursos renováveis.

Já o movimento ambiental da década de 60, que revelou o quanto a poluição industrial afeta a vida selvagem e os seres humanos, questionava a possível contaminação do ar, da água e da terra por descargas acidentais de radioatividade dos reatores nucleares. Além disso, revelações recorrentes sobre a extensão do manejo inadequado de resíduos químicos perigosos tiveram o efeito colateral de criar opinião adversa sobre os resíduos radioativos.

Outro fator que resultou na queda da popularidade da tecnologia nuclear foi a crescente perda de respeito para com o governo norte-americano. Mudanças na política de gestão dos resíduos radioativos, de uma administração para outra, resultaram em inação, interpretada, por sua vez, como prova de ignorância ou inépcia. A opinião comum era que ninguém sabia o que fazer com os resíduos nucleares.

Já a confusão criada pelas diferenças nítidas na opinião dos cientistas sobre o desenvolvimento da energia nuclear causou incertezas na opinião pública. Ganhadores do prêmio Nobel ficaram divididos em ambos os lados do argumento, confundindo, consequentemente, o público em geral.

Além disso, a associação dos reatores com as armas nucleares foi e ainda é muito forte. De fato, os dois podem envolver o Plutônio, empregam o processo físico da fissão com nêutrons e têm subprodutos radioativos. Entretanto, essa conexão, cultivada pelos opositores da energia nuclear, enfatiza as semelhanças ao invés das diferenças entre eles.

Os acidentes envolvendo reatores nucleares são os que mais abalam a percepção pública no longo prazo, pois alimentam o medo fantasmagórico da radiação – o inimigo invisível. O físico norte-americano David Bodansky explica que diante de acidentes, as pessoas conseguem lidar melhor com efeitos de curto prazo, aqueles que acabam ao término do acidente. Entretanto, os acidentes nucleares, mesmo que no curto prazo resultem em poucos (ou nenhum) mortos e feridos, apavora as pessoas pela possibilidade de efeitos de longo prazo da exposição à radiação.

O acidente de Chernobil, o maior acidente nuclear da História, resultou na morte de 40 pessoas em até 3 meses após o acidente (veja esse post). Quanto aos efeitos de longo prazo, diversos estudos conduzidos por comissões internacionais de especialistas apontaram um aumento na incidência de câncer de tireóide nas crianças. Em números oficiais, 13 crianças morreram. Entretanto, milhares de imagens de mutações genéticas e cânceres são automaticamente associadas ao acidente na antiga União Soviética, mesmo que a relação causal entre a exposição à radiação e o câncer seja difícil, senão impossível, de provar.

Os pró-nucleares estão convencidos de que se as pessoas fossem devidamente informadas, a tecnologia nuclear seria aceitável. Segundo o físico Raymond Murray, da Universidade de Carolina do Norte, nos Estados Unidos, esta visão é apenas parcialmente correta, pois para ele “medos irracionais não podem ser removidos por fatos adicionais”.

Muitas pessoas têm procurado analisar esse fenômeno do medo nuclear, mas o estudo do físico Spencer Weart, ex-diretor do Centro de História da Física do Instituto Americano de Física (AIP) nos Estados Unidos, é um dos melhores. Ele argumenta que as imagens, tanto as criadas na ficção, como monstros radioativos, planetas explodindo como resultado da guerra nuclear e dispositivos estranhos que emitem raios gama, quanto as fotografias e outras imagens, conectam-se com forças sociais e psicológicas e influenciam de forma significativa o pensamento das pessoas sobre a tecnologia nuclear.

Pouco antes do acidente Three Mile Island, por exemplo, o filme "Síndrome da China" foi lançado. Ele conta a estória de um acidente hipotético em que o núcleo todo de um reator derrete, resultando no derretimento do solo até a China. Embora tal cenário não seja válido, os temores públicos foram despertados.


A percepção pública do risco

Toda atividade humana é acompanhada por certo risco de perda, dano ou perigo para os indivíduos. O simples ato de dirigir um automóvel na estrada, ou de ligar um aparelho elétrico em casa, ou mesmo de tomar um banho, deixa o indivíduo sujeito a certo perigo.

Todos concordam que o consumidor merece proteção contra o perigo que está fora de seu controle pessoal, mas não está claro até que ponto essa proteção restringe o uso das novas tecnologias. Em um limite absurdo, por exemplo, a proibição completa de todos os meios de transporte mecânicos asseguraria que ninguém seria morto em acidentes envolvendo carros, trens, aviões, barcos ou naves espaciais. Entretanto, hoje poucos aceitariam tais restrições. É fácil dizer que uma proteção razoável deve ser fornecida, mas a própria palavra "razoável" tem significados diferentes entre as pessoas.

O conceito de que o benefício deve superar o risco é atraente, mas é difícil avaliar o risco de uma inovação para a qual nenhuma experiência ou dados estatísticos estão disponíveis, ou para as quais o número de acidentes é tão baixo que muitos anos seriam necessários para se acumular estatísticas adequadas. Nesse caso, nem os benefícios são claramente definidos.

Tecnicamente, RISCO é definido como o produto entre a frequência de um evento e as consequências que esse evento pode causar. Para reatores nucleares, frequência significa o número de vezes por ano de operação por reator que se espera que o incidente ocorra. As consequências são os danos, tanto imediatos quanto latentes, que podem abranger desde vidas humanas até grandes prejuízos econômicos.

Entretanto, o público percebe o risco de uma forma muita mais subjetiva. Entram em jogo fatores sociais, ambientais e psicológicos. A percepção do risco vai além do indivíduo. É uma construção social e cultural que reflete símbolos, História e ideologias. Pesquisadores de percepção pública do risco identificaram algumas regras gerais que levam as pessoas a receber o perigo ou com um grito ou um bocejo:

1.As pessoas tendem a perceber riscos naturais como menos assustadores. Talvez isso explique porque energia nuclear é tão temida, mas a radioatividade natural do gás radônio é ignorada.

2.Além disso, riscos impostos parecem piores. O indivíduo pode decidir se quer correr o risco de nadar, mas quando um incinerador de resíduos perigosos é instalado ao lado de casa, ele sente-se impotente e em pânico.

3.Há também o fato de que riscos com vantagens óbvias são menos assustadores. A Medicina nuclear é vista com melhores olhos, pois as pessoas focam nas recompensas que ela pode trazer.

4.Já os riscos associados a tecnologias complexas e catástrofes parecem ser maiores e um dos motivos para essa percepção é que a mídia insiste nas catástrofes.

Medidas de segurança podem e devem ser tomadas para tornar os riscos socialmente aceitáveis. Mas o limite do “o quão seguro é seguro?” não está bem estabelecido. Um exemplo clássico é o uso de um pesticida que assegura a proteção do fornecimento de alimentos para muitos com o perigo finito para certos indivíduos sensíveis. Para a pessoa afetada adversamente, o risco ofusca completamente o benefício. A adição de medidas de segurança é inevitavelmente acompanhada por aumento do custo do dispositivo ou produto e a capacidade ou disposição para pagar por maior proteção varia muito entre as pessoas.

A segurança nuclear, por sua vez, é uma combinação sutil de fatores técnicos e psicológicos. Esse tema insere-se no âmbito da estrutura sócio-econômica-política e está intimamente relacionada com o conflito fundamental das liberdades individuais e de proteção pública através de medidas de controle. É presunçoso exigir que todas as ações possíveis devam ser tomadas para proporcionar segurança, assim como é negligente afirmar que por causa de utilidade evidente, nenhum esforço para melhorar a segurança é necessária.

Para os defensores dessa tecnologia, entre estas visões extremas, há ainda uma oportunidade de se chegar a soluções satisfatórias para o desenvolvimento da tecnologia nuclear em todas as suas potencialidades benéficas, com a aplicação de conhecimento técnico acompanhado da responsabilidade de avaliar e minimizar as consequências sociais e ambientais.


Para saber mais

Japan Earthquake Survey - Snap Poll - Instituto Gallup

Perspective on Public Opinion - NEI

Livro: Nuclear fear: a history of images, Spencer R. Weart, 1988.

Nuclear Stigma por James Flynn, no Livro The Social Amplification of Risk, 2003.


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sábado, 10 de setembro de 2011

Tecnologias nucleares no Brasil

Já indiquei no blog um documentário sobre tecnologias nucleares que tinha como cenário os Estados Unidos. Hoje, trago-lhes um programa muito interessante sobre as tecnologias nucleares que são pesquisadas aqui no Brasil.

A dica foi do físico Airton Deppman (que já publicou seu pitaco aqui no blog). O programa Repórter Senado - Tecnologias Nucleares foi ao ar em 16 de Agosto na TV Senado (sim, ele assiste!!) e pode ser visto nesse site.

O programa explora os ramos da ciência que evoluíram com as Tecnologias Nucleares e como elas vêm sendo usadas na medicina, agricultura e alimentação. Conta com a participação de pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) em São Paulo e pesquisadores do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) em Piracicaba.

Confira!


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Documentário: Tecnologia Nuclear - Maravilhas Modernas

terça-feira, 6 de setembro de 2011

É preciso ser antinuclear para ser ambientalista?

Recebi contribuições muito interessantes nessa última semana que, aos poucos, irei publicando aqui no blog.

Vou começar com uma que me fez pensar se é preciso ser antinuclear para ser ambientalista. Talvez eu tenha dado essa impressão aos leitores com o meu último post. Então, justiça seja feita: existem SIM pessoas que defendem o meio-ambiente sem travar uma Cruzada contra a energia nuclear.

Esse é o caso, por exemplo, do ambientalista dinamarquês Björn Lomborg, autor de dois livros (The Skeptical Environmentalist e Cool It) e diretor do Conpenhagen Consensus Centre na Escola de Negócios de Copenhagen, entre outras coisas.

Confiram esse texto de sua autoria, publicado no The Sheaf em Abril desse ano.

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É cedo demais para abandonar a energia nuclear

Björn Lomborg

Tradução de Ricardo Sovat*

NOVA YORK — Recentemente, quando partes do Japão foram devastadas por um terremoto e pelo tsunami subsequente, as notícias das perdas humanas foram rapidamente ofuscadas pelo medo global da precipitação radioativa vinda da usina nuclear de Fukushima. A preocupação era compreensível: radiação é muito assustadora. Eu cresci na Dinamarca, num tempo em que o medo da energia nuclear era generalizado.

Porém, nossos últimos medos nucleares possuem implicações mais abrangentes, especialmente quanto ao fornecimento de energia e nosso desejo de nos afastarmos da dependência de combustíveis fósseis. É difícil distanciar-se no momento de um desastre natural de modo a ter uma perspectiva mais ampla; mesmo tentar fazê-lo pode parecer estúpido. Mas existem alguns fatos que não devemos ignorar.

Durante a cobertura diária do drama nuclear, o fantasma de Chernobyl foi invocado repetidamente. Vale a pena notar que o pior desastre na história causou apenas 31 mortes diretamente. A Organização Mundial de Saúde estima que 4000 mortes possam estar ligadas àquele desastre ao longo destes de 70 anos, enquanto que a OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos) projeta algo entre 9000 e 33000 mortes durante este tempo.

Isto é considerável. Porém, leve em conta que, de acordo com o OECD, a cada ano aproximadamente um milhão de pessoas morrem por causa de micropartículas da poluição atmosférica. Contudo, esta taxa de morte em massa não provoca nenhum medo visível no mundo desenvolvido, e não recebe virtualmente nenhuma cobertura da mídia.

Claro, cada país com instalações de energia nuclear deveria revisar suas medidas de segurança em vista do desastre japonês, que levantou questões óbvias sobre os locais escolhidos para essas instalações. Claramente, usinas localizadas próximo a áreas propensas a tsunamis precisam ser repensadas e alguns países têm usinas assustadoramente próximas a falhas sísmicas — e a grandes cidades.

Porém, enquanto o compromisso dos EUA com a energia nuclear foi rapidamente reafirmado pelo Presidente Barack Obama, alguns governos europeus tomaram a decisão submissa de congelar imediatamente todos os novos projetos de energia nuclear, e, no caso da Alemanha, não estender a vida útil dos reatores existentes. Para a Alemanha, isto vai deixar um vazio que não poderá preencher com fontes de energia alternativas, restando-lhe poucas escolhas a não ser basear-se mais intensamente na energia do carvão.

Vemos o carvão como uma fonte de energia poluente, mas razoavelmente “segura”, comparada à energia nuclear. Contudo, só na China, acidentes na minas de carvão matam mais que 2000 pessoas a cada ano — e o carvão é a principal causa do smog, da chuva ácida, do aquecimento global e da toxicidade do ar. Em decorrência da decisão da Alemanha, espera-se agora que sua emissão anual de carbono aumente em 10% — em um momento em que as emissões da União Europeia estão subindo ao mesmo tempo em que o continente é sacudido pelos efeitos da crise econômica.

A Alemanha não tem uma alternativa de baixa emissão de carbono se fechar suas usinas nucleares, e o mesmo vale para a maioria dos outros países. Fontes de energia alternativa são caras demais e de modo algum são confiáveis o suficiente para substituir combustíveis fósseis.

Embora preocupações de segurança sejam preponderantes neste momento, a construção de novas usinas enfrenta outro obstáculo: elas são muito caras. Novas usinas nucleares apresentam elevados custos prévios (o que pode ser politicamente desafiador), incluindo um processo de planejamento muito complicado, demorado e tenso. No final, o custo total de uma usina nuclear é significativamente mais alto que o da usina mais barata baseada em combustível fóssil. E a sociedade precisa suportar custos adicionais significativos em termos de riscos de armazenamento de resíduos de combustível e de acidentes em larga escala. Além disso, na maior parte do mundo onde o consumo de energia está aumentando, a proliferação nuclear é uma questão levada em conta.

E existe a questão de manter as usinas existentes. Desativar reatores nucleares pode fazer-nos sentir mais seguros, mas nós deveríamos reconhecer que isto frequentemente significará compensar a perda de produção com maior dependência do carvão, implicando mais emissões que contribuem para o aquecimento global, e mais mortes, tanto da extração do carvão como da poluição atmosférica.

Além do mais, levando-se em conta que as usinas já se pagaram, as instalações para os resíduos já estão prontas e o alto custo da desativação terá de ser pago não importa quando, os custos reais de operação são muito baixos — metade ou menos por quilowatt-hora do que o custo dos combustíveis fósseis mais baratos.

A solução em longo prazo é mais pesquisa e desenvolvimento — não só em energia nuclear mais segura, de ponta, mas também em fontes energéticas como solar e eólica, que atualmente produzem bem menos que 1% da energia do planeta. De forma alarmante, estas pesquisas foram reduzidas ao longo das últimas três décadas.

Em protestos que exigiam que os políticos se posicionassem quanto à mudança climática, um grito soou: “Sem carvão, sem gás, sem nucleares, sem brincadeira!” A dura realidade — evidenciada elo desastre japonês — é que nós não podemos ainda nos dar ao luxo de desprezar o carvão, o gás e a energia nuclear. Até que possamos ter uma alternativa viável, reduzir a dependência em qualquer um deles significa que outro do grupo tem que tomar seu lugar.


* Obrigada pela participação e tradução Ricardo. 


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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Energia nuclear: o retrocesso do debate


Domingo, 21 de Agosto de 2011. Eis que surge, na Folha de São Paulo, um exemplo ESPETACULAR de como NÃO conduzir o debate sobre a energia nuclear no Brasil! Na coluna Tendências e Debates, o Dr. Alfredo Bosi, professor da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP (Universidade de São Paulo) discorre sobre o tema de forma lamentável! Entretanto, antes de dar o meu pitaco, convido vocês à leitura da coluna.

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Angra 3 é uma questão ética

ALFREDO BOSI

O referendo italiano que rejeitou maciçamente as usinas nucleares é modelo de participação popular; talvez seja o caso de imitá-lo aqui
 

Se a construção de uma usina nuclear fosse apenas uma questão técnica, seria reduzido o número das pessoas capazes de opinar sobre o assunto. Mas os riscos a que estão sujeitas as populações que vivem perto dos reatores são inegáveis. Como nenhum cientista pode afirmar que o risco é zero, a questão passa a ser ética.
Como delegar a sorte de milhares de cidadãos à onipotência de alguns tecnocratas e aos interesses desta ou daquela empresa? Um programa sem o respaldo da opinião pública esclarecida é acintosamente antidemocrático. O referendo italiano que rejeitou maciçamente as usinas nucleares é modelo de participação popular. Talvez seja o caso de imitá-lo.
Na Alemanha, a decisão do governo de suspender o programa nuclear atendeu a um movimento cívico que exige investimento em formas de energia renováveis e seguras. Por que o BNDES se dispõe a malbaratar bilhões de dólares em Angra 3 em vez de aplicar esse capital, arrancado aos contribuintes, na difusão em larga escala daquelas formas de energia?
As empresas nucleares preferem privatizar benefícios e socializar prejuízos, no caso, perigos.
Mas não há dinheiro que possa indenizar câncer hepático ou leucemia nas crianças vítimas dos vazamentos. O cidadão brasileiro tem o direito de perguntar: o que será feito com o lixo de Angra 1, 2 e 3? Que direito temos de legar aos pósteros esse pesadelo?
O presidente Bush autorizou a remoção dos rejeitos para depósitos a serem cavados em Yucca Mountain, mas a população do Estado de Nevada e as comunidades indígenas que lá vivem há séculos rebelaram-se contra uma decisão que violava o seu território. Obama prometeu revogar o decreto do antecessor, mas o impasse continua.
Físicos da envergadura do saudoso Mário Schenberg (que condenou a instalação de uma usina em Iguape), J. Goldemberg, Pinguelli Rosa, Cerqueira Leite, Ildo Sauer e Joaquim Carvalho alertam para o caráter desnecessário da energia nuclear no Brasil. As potencialidades de nossa biomassa, bem como de outras fontes renováveis, fornecem base segura para um desenvolvimento sustentável.
Nossos cientistas são evidentemente favoráveis a pesquisas na área nuclear que tenham aplicações na biologia, na medicina e na agricultura. A energia nuclear é cara. Dados do Greenpeace: "O preço da tarifa ao consumidor pode sair por US$ 113/MWh, contra US$ 74/ MWh da energia gerada pela biomassa e US$ 82/MWh da eólica".
Arriscada, desnecessária, cara..., mas dirão que é limpa; desde quando lixo atômico é sinal de limpeza?
O enriquecimento do urânio depende de eletricidade gerada por combustíveis fósseis, como o carvão. Duas das minas de carvão mais poluentes dos Estados Unidos, em Ohio e em Indiana, produzem eletricidade para enriquecer urânio. É o que informa B. Sovacool no número 150 da "Foreign Policy".
Enfim, uma boa notícia. A OAB anunciou, em 4 de julho de 2011, que está recorrendo ao Supremo Tribunal Federal exigindo que a eventual retomada das obras de Angra 3 só possa fazer-se com autorização do Congresso Nacional e mediante nova legislação federal.
Assim o requer a Constituição de 1988. Que os parlamentares ouçam a voz dos eleitores e não se dobrem às pressões de empresários gananciosos e políticos desinformados.


ALFREDO BOSI, 74, é professor emérito da USP, membro da Academia Brasileira de Letras e participante da Coalizão Brasileira contra as Usinas Nucleares
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E aí, o que acharam? Bem, eu digo o que eu achei. Este texto é cheio de pré-conceitos e trapaças.

Notem que já no primeiro parágrafo, o autor tenta desmoralizar, com argumentos banais, os cientistas, mais precisamente aqueles que passaram anos de suas vidas se dedicando ao estudo de reatores nucleares. Isso, claro, numa tentativa de justificar por que os leitores devem continuar lendo a opinião do "não-cientista". Eu considero esse tipo de postura inaceitável em uma pessoa que se diz formadora de opinião. É certo que a Ciência não tem todas as respostas para os problemas da Humanidade, mas desacreditar completamente os cientistas não é o caminho, a menos que o objetivo seja criar uma nova seita ou religião

Também é certo que nenhum cientista possa afirmar que o risco a que estão sujeitas as populações que vivem perto dos reatores seja nulo, porque de fato não o é. Nada tem risco zero! Vivemos cercados de riscos por todos os lados. Ao comer uma simples paçoca, ou andar de ônibus, ou fazer aula de natação!

Em um aspecto eu concordo com o autor: sou a favor de uma opinião pública esclarecida (tanto o é que fiz esse blog!). Mas, ao mesmo tempo em que defende isso, o autor esconde muitas informações nas entrelinhas! Ele não disse, por exemplo, que 95% do que ele chama de "lixo atômico" pode ser reaproveitado para gerar mais energia. Que pesadelo deixaremos aos nossos descendentes: uma fonte de energia para o futuro!

Entretanto, o mais cruel desse texto é sua falsa aparência de cordeiro. Por trás da figura nobre da participação popular, há um discurso tão traiçoeiro quanto um lobo faminto!

Substituam a palavra "ética" por "ideologia" e, voilá, estamos de volta aos anos 70! Para quem não era nem nascida(o), como eu, os anos 70 ficaram marcados pelo discurso anti-nuclear proclamado aos quatro ventos pelo movimento ambientalista. Compreensível, considerando-se os eventos da época: os testes de armas nucleares durante a guerra fria.

Porém, mesmo após serem interrompidos os testes das bombas nucleares (com a assinatura do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares) e de serem adotadas medidas para se aumentar a segurança das usinas nucleares e do armazenamento dos resíduos radioativos, ambas reivindicações do movimento, o discurso anti-nuclear continuou, por ideologia mesmo, igual. E é aí que mora o perigo!

Esse discurso dos anos 70 foi marcado pelo medo cada vez mais crescente das pessoas. O físico Spencer Weart, em seu livro "Nuclear Fear", esclarece que o medo nuclear não foi a única forma de imaginação, e muito menos a única força social, por trás do movimento ambiental. Mas, o medo nuclear teve um lugar especial. Ele despertou emoções mais cedo e em um nível mais visceral do que qualquer outro assunto. E serviu como uma bandeira que reuniu diferentes tribos. Em troca, o ambientalismo deu uma base sólida de medo nuclear para as massas de seguidores, para um conjunto de ideais e para a oposição aos reatores nucleares.

E estamos diante desse discurso novamente. As imagens do medo nuclear ainda são muito fortes no imaginário popular e expressões como "nenhum cientista pode afirmar que o risco é zero", "não há dinheiro que possa indenizar câncer hepático ou leucemia nas crianças vítimas dos vazamentos" e "esse pesadelo (...) lixo atômico", além de carregadas de pré-conceitos, incitam, automaticamente, a mente do leitor ao medo.



Sendo o medo uma das formas mais eficazes de CONTROLE SOCIAL, pergunto: usar e abusar de um discurso que induz o medo nuclear na sociedade é, realmente, uma forma ÉTICA e DEMOCRÁTICA de conduzir o debate sobre a energia nuclear no Brasil?



Não, Não e NÃO! Falo e repito: 
ISSO É UM RETROCESSO NO DEBATE!



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