domingo, 31 de julho de 2011

E o tal do "lixo atômico"?

É comum a expressão "lixo atômico" ser usada para se referir aos resíduos radioativos produzidos pelas usinas nucleares, hospitais e indústrias. Na verdade, resíduo radioativo é
qualquer material resultante de atividades humanas que emitem radiação em quantidades superiores aos limites estabelecidos por normas do governo de cada país e para o qual a reutilização é imprópria ou não prevista.

Esse vídeo produzido pela Eletronuclear, empresa responsável pelas usinas de Angra dos Reis, trata a questão dos resíduos radioativos fazendo algumas comparações bem interessantes:



Os resíduos radioativos são organizados em três classes, segundo o nível de radioatividade que apresentam: de baixa, média e alta atividades. São classificados também em função da meia-vida dos elementos radioativos presentes nos mesmos, como rejeitos de longa e de baixa duração.

Os resíduos de baixa atividade (“Low Level Waste – LLW”) compreendem, principalmente, materiais ligeiramente contaminados como papéis, plásticos, vestimentas e ferramentas. Também são classificados dessa forma a maior parte dos gases e dos líquidos ativados ou contaminados produzidos durante a operação de uma Usina Nuclear. Já os resíduos de média atividade (“Intermediate Level Waste – ILW”) compreendem filtros, resinas e outros materiais que sofreram contaminação.

Atualmente, existem tecnologias seguras para o gerenciamento de resíduos de média e baixa atividades, desde sua coleta até o armazenamento nos depósitos iniciais. No caso do Brasil, os resíduos sólidos de baixa e média atividades são acondicionados em embalagens metálicas, testadas e qualificadas pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e transferidos para os depósitos iniciais, construídos na própria Central Nuclear de Angra dos Reis (foto à esquerda). Esses depósitos são permanentemente controlados e fiscalizados por técnicos de proteção radiológica e especialistas em segurança da Eletronuclear.

Os resíduos de alta atividade (“High Level Waste – HLW”) têm atividade de vida longa e, como geram quantidades consideráveis de calor (calor de decaimento), necessitam de resfriamento por no mínimo 10 anos. Durante esse período, esses resíduos são mantidos em instalações de armazenamento inicial (piscinas de resfriamento de combustível usado como a de Angra 1 na foto à direita) junto às centrais nucleares que os produziram, obedecendo normas internacionais de segurança. O Brasil é signatário da Convenção Internacional para Gerenciamento Seguro de Rejeitos Radioativos e Combustível Usado, sendo periodicamente auditado pela Agência Internacional de Energia Atômica com base em relatório que bianualmente é encaminhado a essa organização.

Além dos resíduos produzidos pelas usinas nucleares, há aqueles produzidos pela área da saúde e a industrial. A CNEN mantém, armazenadas em seus institutos no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Belo Horizonte, em Goiânia e em Recife, fontes radioativas em desuso, recebidas de clínicas médicas, hospitais, indústrias e centros de pesquisa. O transporte, o tratamento e o armazenamento desses materiais também são realizados seguindo padrões internacionais de segurança recomendados pela Agência Internacional de Energia Atômica.

Como a quantidade de resíduos radioativos produzidos no Brasil é pouca quando comparada à de países que têm uma participação maior da energia nuclear em suas matrizes energéticas (França, Japão e os Estados Unidos, por exemplo), os resíduos que estão estocados nos Depósitos Iniciais da Central Nuclear em Angra e nos da CNEN deverão permanecer onde estão até que seja construído um depósito de longo prazo ou definitivo, cuja responsabilidade de implantação é da CNEN.

Segundo a própria Eletronuclear, o esgotamento da capacidade de armazenamento do Centro de Gerenciamento de Rejeitos da Central Nuclear dar-se-á em 2020, quando, segundo planejamento da CNEN e da Eletronuclear, o depósito definitivo de resíduos radioativos já estará implantado. Para os elementos combustíveis usados, a capacidade das piscinas existentes é até 2021. Entretanto, está em andamento a construção de um depósito inicial de combustível irradiado na Central Nuclear para armazenar os combustíveis irradiados que hoje estão nas piscinas anexas aos reatores.


O Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro (CDPNB), criado em julho de 2008 por decreto do Presidente da República, estabeleceu como meta que o Depósito Final de Rejeitos Radioativos de Baixa e Média Atividades (Repositório Nacional) entre em operação em 2018 e que o Depósito Intermediário de Longa Duração para combustível usado, em 2026.

As bases conceituais para a implantação do Repositório Nacional de Rejeitos Radioativos de Média e Baixa Atividades já estão elaboradas e estudos sobre as condições geológicas favoráveis à localização desse repositório estão sendo realizados pela CNEN. O ínicio das obras está previsto para 2014. Cabe destacar que o destino final dos resíduos de baixa e média atividades há muito tempo não constitui um desafio tecnológico apreciável, estando tecnicamente resolvido nos diversos países que possuem parques de geração nucleoelétrica bem maiores que o brasileiro e utilizam a energia nuclear na medicina, na agricultura e na indústria.

É importante esclarecer que os combustíveis usados ainda guardam cerca de 40% de sua capacidade de gerar energia. Por essa razão, alguns países, como França, Japão, Rússia, Índia e China têm como política a reciclagem dos combustíveis irradiados através de reprocessamento e utilização de combustível de óxido misto Urânio-Plutônio (MOX) em reatores do tipo LWR - que usam água leve como refrigerante.

O reprocessamento dos elementos combustíveis visa à separação do material físsil e fértil, principalmente Plutônio e Urânio, dos produtos de fissão, para eventual uso posterior como combustível. O objetivo principal do reprocessamento é reduzir o volume de rejeitos. Sua política é, também, uma ação ecológica que visa a preservar os recursos naturais (jazidas de urânio).

Essencialmente, 95% do combustível usado nada mais é do que urânio, material físsil e, portanto, combustível passível de reciclagem. Dos restantes 5%, cerca de 3% são elementos radioativos que decaem rapidamente e, após um ou dois anos, representam ameaça insignificante. De fato, apenas 2% do material que sai do reator, após transformar massa em energia por cerca de três anos, constituem resíduos radioativo de alta atividade e longo prazo de decaimento. Por conseguinte, soluções definitivas (repositórios eternos) ainda não existem porque até então não são imediatamente necessárias.

No caso brasileiro, a reciclagem de elementos combustíveis usados ainda não é viável nem técnica nem economicamente. Por isso, o Depósito Intermediário de Longa Duração para elementos combustíveis usados será projetado, construído e operado de forma a garantir tecnicamente o armazenamento seguro, isto é, isolado do público e do meio ambiente, do combustível usado pelas usinas nucleares nacionais existentes e a serem implantadas, por período não inferior a 500 anos (!). A seleção do local está prevista para 2016 e o ínicio da construção para 2021.

Essa concepção, que permite a armazenagem com opção de recuperação posterior do combustível, permite esperar responsavelmente a melhor solução técnica e econômica para o destino final dos resíduos de alta atividade, ou a decisão de reciclagem do combustível usado para a geração de energia elétrica, solução que já é praticada por diversos países. Os brasileiros terão assim a tranquilidade de, nos próximos séculos, não sofrerem qualquer efeito negativo decorrente desses resíduos, guardando para as futuras gerações a possibilidade de utilizar esse material como uma fonte de energia adicional.


Para saber mais:

O gerenciamento de rejeitos - Site da Eletronuclear
Rejeitos Radioativos - Site da CNEN

Posts relacionados

Bê-a-bá nuclear: Radioisótopos, Radiação, Atividade, Decaimento Radioativo, Calor de Decaimento.

Um comentário: