domingo, 5 de agosto de 2012

Todo azul, azul da cor do mar!

Reator de pesquisa ATR
Taí uma bela imagem do núcleo do reator de pesquisa ATR (Advanced Test Reactor), do Laboratório Nacional de Idaho, nos Estados Unidos.

O fantástico brilho azul que vemos na imagem ao lado é conhecido como Radiação Cherenkov (ou Cerenkov ou Tcherencov). Essa radiação eletromagnética é produzida quando partículas carregadas, como os elétrons, deslocam-se em um meio com velocidades maiores que a da luz nesse meio!

Esse fenômeno foi observado pela primeira vez em 1934 pelo cientista russo Pavel Cherenkov  que percebeu um brilho azulado em uma garrafa de água sujeita a um bombardeamento radioativo. Esses estudos renderam-lhe o prêmio Nobel em 1958, juntamente com Vavilov (seu supervisor na época) e Frank e Tamm que forneceram a explicação formal do fenômeno.

Veja a imagem abaixo para entender melhor como isso funciona. À medida que uma partícula carregada se desloca em um meio, ela perturba o campo eletromagnético local desse meio. Como resultado, os elétrons ligados aos átomos do meio são levemente deslocados, tornando tais átomos temporariamente polarizados pela passagem da partícula carregada. Quando os átomos voltam à sua configuração normal, eles emitem fótons para se livrar do excesso de energia que a passagem da partícula carregada ocasionou em suas configurações eletrônicas.


Polarização causada por um elétron livre deslocando-se a velocidades maiores que a da luz no meio. Nesse caso, os elétrons ligados aos átomos tendem a se afastar do elétron livre, produzindo uma polarização temporária nos átomos do meio.


Os reatores nucleares refrigerados a água leve são ambientes bastante favoráveis para a produção dessa radiação, pois nos reatores há partículas carregadas circulando para todos os lados. E os elétrons, em especial, por serem bastante leves, podem atingir velocidades altissímas, maiores que a da luz da água!

Elétrons são produzidos de diversas maneiras nos reatores nucleares. Eles podem, por exemplo, ser emitidos pelos produtos de fissão instáveis - aqueles elementos químicos que são formados após a fissão nuclear mas ainda não atingiram uma configuração de equilíbrio. Mas, para tais elétrons produzirem essa radiação azul, é necessário que eles se desloquem pela água com velocidades superiores a 225 mil kilômetros por segundo - a velocidade da luz na água.

Note que isso não viola a famosa lei da Física de que nada viaja mais rápido que a luz no vácuo! Embora a velocidade da luz no vácuo seja aproximadamente igual a 300 mil kilômetros por segundo, quando a luz se desloca em um meio, sua velocidade pode ser bem menor do que isso e algumas partículas podem atingir velocidades maiores que a da luz no meio!

Essa alta velocidade produz um efeito bastante curioso: a radiação produzida por uma partícula carregada é altamente colimada e desloca-se atrás da partícula carregada (já que a luz é mais lenta que a partícula no meio!). É por isso, inclusive, que a radiação Cherenkov é dita a análoga luminosa do estrondo sônico ("sonic boom") dos aviões supersônicos! O vídeo abaixo (em inglês) explica de forma bem didática esse fenômeno.





Como o próprio vídeo apresentou, a radiação Cherenkov não é exclusiva dos reatores nucleares. Esse fenômeno serviu como base para o desenvolvimento dos detectores Cherenkov, detectores de partículas de altas energias muito utilizados em experimentos de física de partículas (como o famoso LHC) e na detecção de raios cósmicos (como no Observatório Pierre Auger). 

Se você quiser ver ao vivo e "em azul" essa radiação, você pode visitar um dos dois reatores nucleares de pesquisa do tipo piscina existentes no Brasil: o IEA-R1, localizado no IPEN em São Paulo, e o TRIGA, localizado no CDTN em Belo Horizonte.

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